HORA CERTA

sexta-feira, 28 de setembro de 2007

60 anos depois...

Artigo muito bom retirado do site segundaguerramundial.com.br, vale a pena cada segundo de leitura e nos leva a pensar no momento atual.

A Humanidade no pós-Segunda Guerra

Mesmo após 60 anos, as bases construídas após o fim do conflito ainda são sustentação ao teatro de forças no nosso planeta


Por Carlos Brazil

Há 60 anos terminava a Segunda Guerra Mundial. Foi um conflito que deixou um triste e vergonhoso legado à humanidade: mais de 50 milhões de pessoas morreram em seis anos, dentre os quais 6 milhões de judeus assassinados pelo regime nazista. As imagens dos campos de concentração nazistas - que, além dos judeus, mantinham em condições subumanas outras minorias, como ciganos, homossexuais, testemunhas de Jeová - reveladas após as tropas aliadas conquistarem os territórios até então dominados pelas forças militares alemãs mostraram ao mundo a face mais terrível das atrocidades que o homem é capaz de cometer.

Apesar de tanta destruição, a história jamais parou. O homem tem grande capacidade de se reiventar e reconstruir sua existência sobre escombros, dramas, catástrofes e dificuldades as mais diversas.
Então, afinal, o que vem sendo construído pela humanidade até os dias atuais sobre os alicerces moldados a partir do fim da Segunda Guerra Mundial?
"Depois que os alemães invadiram a Rússia, o sentido da guerra modificou-se. Porque eles chegaram basicamente às portas de Moscou, mais exatamente a uns 20 quilômetros de Moscou, a Rússia conseguiu empurrar eles para trás, mais ou menos a uns 100 quilômetros de distância, e, posteriormente, quando ocorreu a batalha de Estalingrado, em que o Exército Vermelho conseguiu derrotar o Exército alemão, a guerra mudou de rumo, porque, a partir daí, era uma questão de tempo. A partir dali, para mim, a Alemanha estava perdida. O Exército Vermelho conseguiu avançar em uma velocidade relativamente elevada e o mundo socialista cresceu de forma significativa... O socialismo propriamente dito, decorrente da vitória da União Soviética, chegou a dominar 30% dos países que tinham influência no encaminhamento da vida da família humana", afirma Enildo Pessoa, professor aposentado e ex-diretor do Instituto de Ciência Humanas da PUC-Campinas, autor de sete livros, entre eles A Humanidade e o Futuro.


Desta forma, com a vitória da União Soviética na Europa Oriental e as conquistas da Aliança capitaneada pelos Estados Unidos na parte Ocidental daquele continente, começava a se desenhar um cenário em que as forças que dominariam a civilização atuavam em dois pólos opostos.

Nova ordem
"A primeira coisa que se destaca é uma nova ordem mundial que vai se formar naquele momento. A gente vai ter o que chama de um mundo bipolarizado, porque, antes, era multipolarizado. Portanto, o efeito maior da Segunda Guerra é criar uma ordem mundial girando em torno da União Soviética e dos Estados Unidos. Esse efeito perdurou até recentemente, quando acabou a União Soviética, o que já muda novamente a ordem mundial, que não é mais aquela que a Guerra deixou para a gente", explica a professora do Departamento de História da UFPE (Unviersidade Federal de Pernambuco) Suzana Cavani Rosas.
"A outra coisa é que a Segunda Guerra mudou a natureza da guerra. A guerra convencional cedeu lugar à possibilidade de uma guerra nuclear (após o bombardeio nuclear de Hiroshima e Nagazaki, no Japão). E, contraditoriamente, como essa guerra nuclear tem uma proporção de destruição muito grande, e até mesmo a parte que seria vencedora teria muitas perdas, formou-se a Guerra Fria. Quer dizer: a impossibilidade de um conflito armado entre as duas grandes potências. Elas têm tudo para brigar, são inconciliáveis, mas a ameaça de uma guerra nuclear evita o confronto das grandes potências. O que você vai ter são outros confrontos indiretos entre essas potências em diversos países no mundo", acrescenta Suzana Cavani.


Dessa forma, o mundo passava das contradições internas ao próprio capitalismo (que deram origem à Primeira e à Segunda Grande Guerra Mundial) para as contradições de duas ideologias diversas: o capitalismo, defendido pelos Estados Unidos; e o socialismo, sob a égide da União Soviética. O embate dessas duas superpotências que emergem do pós-Guerra vai se dar não campo de batalha - já que a guerra, agora, seria sinônimo de destruição da própria raça em razão da Corrida Armamentista com a multiplicação dos arsenais atômicos de ambos os lados -, mas no terreno nebuloso que passou a ser conhecido como Guerra Fria.

Fim dos Impérios
Outro efeito significado do pós-Guerra foi o processo de esfacelamento dos grandes impérios coloniais, principalmente com a perda do poderio de duas grandes potências até a Segunda Guerra: França e Inglaterra.
"A Europa vai ter que mudar completamente sua perspectiva. Quase todos os países europeus, pelo menos os países centrais da Europa Ocidental, tinham grandes impérios. E eles vão passando por um muito lento processo de desintegração dos Impérios, que às vezes acontece de forma, vamos dizer assim, pacífica, e um pouco comandada pelo país dominante. A Inglaterra em alguns momentos percebe que não tem condições de aguentar a luta e acaba de certa forma dizendo que concede a independência: é o caso da Índia. Ou você vai ter processos tremendamente violentos. Acho que um dos exemplos mais claros é a guerra da Argélia, que deixa um milhão de pessoas mortas e vai se processar na década de 60. Mas é um processo que vai continuando até os 70, entra nos anos 80, e ainda existem pequenas coisinhas que não foram resolvidas. Então, isso é um resquício de guerra", diz a professora de História Contemporânea da FFLCH-USP (Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo) Maria Aparecida Aquino.
"E também houve a descolonização porque tanto os Estados Unidos quanto a União Soviética sempre defenderam o fim do impérios coloniais. Os impérios formais, claro, porque o imperialismo vai ainda existir", acrescenta Suzana Cavani.


Mas não houve apenas efeitos de desconstrução e reconstrução no legado do pós-Segunda Guerra. A condição da mulher na sociedade Ocidental sofreu mudanças profundas e definitivas que representaram verdadeiras conquistas à condição feminina.
"Por conta da guerra, a maioria dos países envolvidos tiveram que integrar cada vez mais a mão-de-obra feminina à produção, porque essa Guerra mobiliza muitos homens, realmente numa proporção muito grande, e, portanto, era preciso substituir a mão-de-obra masculina dentro da Guerra. Aí as mulheres conseguiram conquistar um espaço que daí para a frente não houve mais retorno", destaca a professora Suzana Cavani.


Crises e oportunidades
O período vivido durante a Guerra Fria foi repleto de graves crises que abalaram, em alguns momentos, seriamente o equilíbrio de forças que era mantido sobre um tênue fio que por pouco não se desfez em um conflito atômico generalizado. Foi o caso da crise dos mísseis em Cuba, em 1962, quando Estados Unidos e União Soviética por pouco não partiram para a solução do impasse na base de um conflito atômico. Outras graves crises marcaram o pós-Guerra, como a Guerra da Coréia, a Guerra do Vietnã, a invasão da Baía dos Porcos, em Cuba.
Neste meio tempo, o mundo conheceu um grande desenvolvimento do lado capitalista. "É a partir daí que acontece o fenômeno que o (historiador britânico Eric) Hobsbawn chama de `Era de Ouro do Capitalismo´. A partir do final da década de 50 até princípios da década de 70, mais ou menos 72, 73, o mundo capitalista sofre um crescimento extraordinário, agora sob uma nova condição, que era justamente aquela de que as contradições internas ao capitalismo não levariam a um conflito mundial (já que as contradições principais eram direcionadas ao combate ao socialismo)... Por isso ele teve todas as condições de ter um crescimento fenomenal atingindo um porte que até hoje continua a existir... Simultaneamente a isso, o sistema socialista começava a indicar a suas situações de fragilidade. Para mim, a pincipal fragilidade era a política. O sistema tinha conquistas sociais significativas, mas tinha fragilidades políticas muito fortes porque não soube enfrentar o capitalismo demonstrando ao mundo que ele seria capaz de resolver a situação social sem que houvesse a prioridade do capital no encaminhamento da vida da sociedade", analisa o professor Enildo Pessoa.


No final dos anos 80, início dos 90, começa a derrocada do Império Soviético, com o primeiro grande fato ocorrendo em 1989, que foi a queda do muro de Berlim, evento que abriu espaço para a reunificação das duas Alemanhas divididas após a partilha do espólio da Segunda Guerra entre os mundos capitalista e socialista.

Entre 1991 e 1992, ocorre a derrocada final da União Soviética, após o surgimento das políticas da perestroika e glasnost (reestruturação e transparência, em russo), capitaneada pelo então líder soviético Mikhail Gorbachóv. Apesar da tentativa de comandar a transição de forma pacífica, Gorbachóv sofre um golpe, é derrubado, mas um contra-golpe encabeçado por Bóris Ieltsin liberta Gorbachóv. Este último acaba deixando o poder, assumido pelo primeiro, que promove o desmembramento da antiga União Soviética, com grande parte de suas Repúblicas se tornando países independentes. A Rússia, que era o coração do Império, no entanto, passa a enfrentar uma séria crise, tanto política como econômica, para se adaptar à nova realidade pós-socialismo.
Efeitos diretos


Há ainda exemplos de ações tomadas no pós-Guerra que afetam significativamente a vida de algumas populações. É o caso dos alemães, derrotados no conflito: "Vamos pensar hoje uma situação muito típica que é a da Alemanha. Quando a Guerra termina, a Alemanha vai ser dividada pela primeira vez depois de se transformar em uma Nação - ela se transforma em uma nação em 1870. Então, até aquele momento ela se mantém uma nação unida, passando por guerras, mas se mantendo uma nação unida. Ela vai ser dividida inicialmente em quatro forças, que acabam depois virando duas forças. Acabamos tendo a Alemanha Ocidental, que é controle mais ou menos do que era o mundo capitalista, mais objetivamentes os EUA, e a Alemanha Oriental, sob controle, obviamente, do mundo soviético", indica a professora Maria Aparecida Aquino.
"Recentemente, na década de 90, você vai passar pelo processo de integração dessas duas Alemanhas. Então, quer dizer, a Guerra se encerra em 1945, mas quase 50 anos mais tarde é que se vai tentar retornar a uma situação que era a anterior. Só que existe um problema aí no meio: 45, 50 anos decorreram e acabaram formando situações muito diferentes. Então, você tem uma Alemanha Ocidental que era considerada a segunda economia do mundo, pujante, extremamente desenvolvida, que, num dado momento, acaba sendo obrigada a receber uma espécie de `presente de grego´ em termos econômicos. Um pouco ela vai carregar uma Alemanha Oriental que tem não só um processo de desenvolvimento histórico dos últimos 50 anos diferente do dela, como também tem um desenvolvimento econômico completamente distinto. Você vai ter hoje, se alinhavando, embora ainda forte, embora garantindo parte de sua pujança, mas, de certa forma, você tem a modificação de um quadro muito contemporâneo, tentando encontrar seu rumo e que se relaciona, sem dúvida, com o que a Segunda Guerra Mundial deixou", acrescenta Maria Aparecida Aquino
Mesmo estando hoje distantes 60 anos do fim da Segunda Guerra Mundial e tendo agregado à raça humana uma série de elementos que determinaram novas realidades à existência do homem, ainda hoje podemos dizer que os alicerces construídos ao fim daquele triste conflito seguem dando base aos atores que determinam os caminhos por onde estamos a escrever nossa história.


O poder dos EUA como nação hegemônica é o elemento mais marcando do cenário construído nesses últimos 60 anos. Além deste, há também o fortalecimento das bases da democracia, especialmente no mundo Ocidental, o desenvolvimento das tecnologias que têm ajudado a salvar vidas e a permitir que o ser humano viva mais e melhor e a constantação de que, mesmo diante da crueza que reprensenta o poder das armas, principalmente as atômicas, as diversas sociedades têm hoje buscado se integrar mais, se conhecer melhor, em busca de um futuro, se não perfeito, que seja melhor para a maioria dos homens.

Que seja assim, portanto, no caminho do entendimento, que o homem construa sua trajetória nos próximos anos e que a inteligência seja instrumento tanto da preservação de nossa espécie como do mundo que nos sustenta.

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